segunda-feira, 16 de abril de 2012

ESTÓRIAS DE MICHAEL.

Chamava-se DEUS.

Não era Pedro ou João de Deus, nem mesmo ostentava outro qualquer nome. Atendia apenas por DEUS.

E com um nome desses, tão simples, nome que perambulava pela boca do povo a todo instante e em todas as partes, DEUS primava pela simplicidade. Diríamos até ser um pouco tímido, avesso que se mostrava a demonstrações que causassem espetaculosidade.

Enfim, DEUS era naturalíssimo.

Assim, DEUS passeava sua simplicidade pelo mundo sem que a ele dessem maior atenção. Tudo via e ouvia calado. Vez ou outra arriscava um palpite que, quando acolhido, mostrava-se sempre acertado. Na calada, DEUS sabia das coisas... e como sabia! Mas era discreto, muito discreto. Como dizem, ficava na sua...

Porém havia um traço, uma particularidade que o diferenciava dos demais. Não havia problema, dificuldade alguma que a ele submetida não tivesse solução. Havia sempre um jeitinho a dar, mesmo que a princípio não entendessem seus modos e maneiras. Diziam que escrevia certo por linhas tortas.

DEUS, de maneiroso, afirmavam alguns, era brasileiro... tinha também suas espertezas, suas manhas.

Outros, por maledicência ou ignorância, talvez ambas, diziam, à boca pequena é claro, que DEUS tinha parte com o diabo.

Ora vejam!...

Jamais o viram reclamar de alguma coisa, quer pela indiferença de alguns, pelo descrédito de outros. Pleno de serenidade, dele emanava uma sensação de paz que em seu redor a tudo harmonizava.

Interessante é que fazia isto graciosamente, gentil que era no trato. DEUS era boa gente.

E sem queixumes, sem reprimendas, a todos acolhia com amor. De tão bom, DEUS não existia... positivamente não era só deste mundo.

Um dia, como sempre um dia, DEUS desapareceu.

Ausência que a princípio não foi percebida, de insignificante.

Tudo continuou como dantes. Sabem como é, não?

As pessoas com seus afazeres, suas preocupações de sempre, cada qual voltada para sua própria vida não encontrava tempo para se incomodar e questionar o sumiço de um cara qualquer.

Além do mais quem poderia saber o paradeiro de alguém que andava para baixo e para cima ao léu? Conhecido por todos e sem domicílio fixo, poder-se-ia dizer que era um cidadão do universo. Parecia estar em toda parte ao mesmo tempo, como se possível fosse.

DEUS não tinha ninguém, a não ser ele mesmo, pobre coitado!

O desaparecimento desse ninguém – perdão! – de DEUS, fato banal, pouco a pouco foi adquirindo outros contornos à medida em que os problemas foram se acumulando sem solução e não havia a quem recorrer. Os tons se fizeram mais fortes. Um silêncio opressivo, só ousado quebrar pela voz da consciência, uma angústia lacerante avizinhou-se e eclodiu em forma e significado.

O vazio trouxe a exata medida da presença que se fora.

Por Deus! Onde andaria DEUS?

Onde se meteu essa criatura?

Procurem-no! Não... não... achem-no!

Quem irá agora nos aconselhar?

E nossos problemas particulares? Afinal são importantes!

Merecemos maior consideração, ele não devia desaparecer assim!

Quem ele pensa que é?

Uma das filhas diletas do desespero é a indignação.

Na crise, DEUS era essencial.

E a ausência preencheu a mente de todos. Nada mais tinha razão, pois não há razão para uma razão desprovida de sentido e para que sentido se nada havia para se perceber?

Afinal, perguntou alguém ainda lúcido, por que DEUS a si foi?

Nunca lhe fizemos mal, responderam.

Todas as vezes em que tínhamos alguma dificuldade a ele recorríamos.

Lembram-se daquela ocasião em que meu filho já havia sido desenganado pelos médicos? Nada mais restava fazer e no entanto...

E desfilaram verdades acompanhando o séquito da gratidão nunca sentida.

E mais que as verdades a procissão das realidades inequívocas, não sujeitas aos estreitos limites espaço-temporais, fez-se presente testemunhando as vezes sem conta em que aquela mão branda, aquela palavra meiga, tinham-lhes mitigado a sede da alma e a fome do corpo.

Cabisbaixos se inquiriam de como reencontrar, já agora, DEUS.

Não seria por que distantes de nossas origens, ao nos afastarmos da natureza, Dele tenhamos nos apartado?

Então, nós O relegamos ao esquecimento, sentenciaram.

Não seria por que a Ele só buscávamos como um ser capaz de satisfazer nossas próprias necessidades e sem nunca proferirmos uma palavra, um gesto de agradecimento sequer?

Então, nós O recebemos como a um objeto, concluíram.

Talvez por que não soubemos repartir o muito que nos deu com outros menos afortunados?

Então, não expressamos a Lei do Amor como sendo Fraternidade, entenderam.

Cegos e insensatos viramos-Lhe as costas e por nossos sentimentos egoísticos deixamos de intuir a Luz.

As sombras, lentamente de início, céleres depois, engolfaram o que presumíamos serem nossas existências.

E cada qual adentrou-se em busca dos caminhos por onde andava DEUS, conscientes agora de que para reencontrá-Lo teriam que vivenciá-Lo como o seu fim último.

Então, e só então, voltou a dar o ar de sua graça.


QUIS UT DEUS?

(QUEM É COMO DEUS?)


- KUAN (FSRB)